segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Primeira Guerra Mundial pelo olhar de Spielberg

A paisagem campestre toma a tela e rapidamente uma pulsante música complementa a grandiosidade do plano. Tudo leva a crer que se está diante de um grande filme. E não é para menos. Trata-se do mais recente trabalho dirigido pelo Rei Midas de Hollywood, Steven Spielberg. Estreia de sexta-feira passada (06/01), Cavalo de Guerra (2011), a despeito de suas qualidades, já é nome certo na corrida pelo Oscar 2012.

A primeira vez em que o pai de E.T. (1984) decidiu fazer incursões sérias a um dos subgêneros mais caros do cinema norte-americano — o de guerra — foi com O Império do Sol (1987). Depois, veio A Lista de Schindler (1993) e, passados cinco anos, O Resgate do Soldado Ryan (1998). Assim, a predileção do diretor parecia ser óbvia: falar sobre o Segundo grande confronto mundial. A explicação é bem simples: o cineasta é judeu e seu pai lutou contra os nazistas. Ou seja, nada mais natural do que ele transpor para a telona as histórias com as quais tinha mais afinidade. Sempre a seu modo spielbergniano de ser. Cenários grandiloquentes, música impactante e cenas belissimamente fotografadas, daquelas de colar na retina. Não por acaso, a trupe dele é, em geral, composta pelos experts Januz Kaminski (fotografia) e John Williams (música), entre outros. 

Em meados de 2009, as primeiras informações que pipocavam na Internet sugeriam que seu próximo trabalho abordaria a Primeira Guerra Mundial. A partir daí, a certeza dos cinéfilos era a de que um filme épico estava a caminho. No entanto, não dava para imaginar em que contexto — ou fora dele (!) — a batalha entre a Tríplice Aliança e a Tríplice Entente ganharia inserção.


A trama de Cavalo de Guerra começa com a dificuldade de uma família de agricultores em manter o seu sustento.  Situada no pequeno condado de Devon, Inglaterra, tudo piora para o clã quando o patriarca resolve adquirir um cavalo num leilão. O propósito é enfrentar o dono do lugar, a quem ele deve o aluguel.  Inicialmente, a ideia era comprar um animal que também ajudasse a arar a terra. O quadrúpede acaba ganhando o afeto do jovem filho do casal. Porém, àquela altura a guerra já era iminente. 
Como um bom contador de histórias que é, o cineasta que inaugurou o cinema apelidado de blockbuster, utiliza todos os recursos característicos de suas produções para falar sobre um assunto sério, mas sem abrir mão de uma marca que se faz presente em boa parte da filmografia do artista: uma ótica respaldada pelo viés da inocência infantil. Foi assim com os já citados E.T. e O Império do Sol. Por sinal, este fala sobre os horrores a que um garoto inglês de 11 anos é submetido, num campo de concentração no Oriente, durante a Segunda Guerra Mundial.

Em sua mais recente superprodução, o homem que mais possui filmes campeões de bilheteria made in Hollywood se vale de uma história de amor. Dessa vez, o foco recai no sentimento de um garoto por um cavalo. De modo a sensibilizar o espectador acerca do quão estúpido é um embate bélico. Seja em que época for. 

O diretor que chegou ao limiar do realismo, com cenas meticulosamente bem orquestradas em O Resgate do Soldado Ryan, agora opta por um caminho diferente.  Saem litros de sangue escorrendo em cabeças dilaceradas por tiros — à beira de saltar da tela — e entra em cena um Spielberg mais brando e menos “cruel”, no seu ponto de vista bem particular acerca da guerra. Que, não é o mesmo de A Lista de Schindler, em que os judeus são alvo de uma crueldade absoluta dos nazistas, e estes são satanizados numa moldura em preto e branco. Apesar do roteiro se arrastar preguiçosamente em seus trinta minutos iniciais, Cavalo de Guerra não deixa a desejar quanto ao que quer dizer com todo o resto. É inegável o fato de que se está diante de um verdadeiro épico. Daqueles que marcaram gerações.


A pretensão do cineasta em comover a plateia com cenas artificiais fica evidente... quanto mais o filme se aproxima do final. O pieguismo bate à porta. Contudo, em se tratando de um legítimo exemplar assinado por Steven Spielberg, não chega a comprometer o conjunto da obra. E mesmo apelando para alguns clichês, o criador de Indiana Jones usa um aguçado e instigante humor para lembrar o quanto todo combate é desnecessário, mediante um bem comum. 
Na cena em questão, ocorre o salvamento do heroico quadrúpede, após ele ter percorrido incansavelmente um vasto campo de batalha e se enroscar em grossos arames farpados.  Soldados representantes dos dois lados, por um breve instante, se entendem na intenção de ajudar o animal. Em meio a um cômico diálogo, a vida do cavalo Joey é salva e o espectador fica exultante por testemunhar uma das maiores sequências da história do cinema.

Emocional e emocionante, na versão inicial de Spielberg sobre a Primeira Guerra Mundial não há vencedores e nem vencidos. Existe apenas o olhar virtuoso de um diretor provando uma vez mais a plena forma que exibe. Isto é, o controle absoluto de sua arte e de seu ofício.

Cavalo de Guerra obteve duas indicações para a próxima edição do Globo de Ouro, que ocorre no próximo dia 15 de janeiro, nas categorias de melhor filme dramático e melhor trilha sonora original. O lendário John Willians responde pela parte musical.

A julgar pelas expectativas, a produção deve chegar com mais força ao prêmio máximo do cinema. Então, é melhor começarem a polir as estatuetas do Rei Midas e sua turma. Pois, aí vem ele... com seu possante alazão.


Por Walter Ferrera

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