sexta-feira, 14 de outubro de 2011

A reciclagem da década perdida

Falta de espírito criativo da década atual ou uma tendência estimulada por uma indústria cujo alicerce se fundamenta numa reivenção que recicla referências do passado? O fato é que os anos 80 estão de volta e com força total, seja no cinema, por meio de remakes, na música, na TV ou na moda, percebe-se que aqueles anos ainda ditam um tipo de comportamento.
Dentro e fora das passarelas, estilistas como Alexandre Hercovicht passaram a usar esse período como fonte de inspiração. Ele foi o responsável pelo figurino da recente produção cinematográfica franco/brasileira À Deriva (2009) de Heitor Dália, cuja história, não por coincidência, é ambientada há três décadas. “Usei memórias de minha adolescência, roupas e marcas que eu usava para compor o figurino. Tive a ajuda de duas pessoas de extremo bom gosto que também viveram naquela época e ajudaram com suas memórias”, disse Alexandre a jornalista de moda Lilian Pace numa entrevista publicada em seu blog.


Fazer a evocação de certos períodos da história é um hábito comum no universo da moda. O mundo fashion vive de recriações sempre buscando mostrar novidades. O que se vê nas passarelas e por tabela, no cinema, tem essa influência, ponto de vista ratificado pela estilista e professora universitária Vivi Gil. “As tendências movimentam o mercado de moda e estão sempre relacionadas ao desejo do novo. Revisitar uma década, como a de 80, por parte dos criadores de moda, significa que o que foi produzido em termos de estilo naquele período, permitiu mais desdobramentos e novas possibilidades criativas.”
O corte de cabelo moicano visto na cabeça da garotada nos dias atuais é uma referência explícita ao movimento punk, um dos maiores símbolos comportamentais da Era Reagan. Mas não é só quanto ao que se aplica às madeixas e se veste que os anos 80 servem de base. Ao que se ouve, também. A música produzida naqueles anos merece menção honrosa. Foram muitas as criações que originaram várias vertentes musicais até hoje revisitadas. Dos gêneros melódicos surgidos nos eighties, o New wave foi o que mais se destacou. Fruto de uma mistura de gêneros que vai do Punk Rock a Disco Music, mas que pode ser traduzida como um parente mais alegre e debochado do Rock, o New Wave também sedimentou a carreira de vários ídolos que faziam a alegria nas discotecas, como Madonna, Cyndi Lauper, entre outros. Na atualidade, cantoras como Lady Gaga saciam-se na mesma inesgotável fonte e corroboram com a aquela velha máxima de que “nada se cria, tudo se copia”.
Para os balzaquianos nostálgicos ou para a galera que aprecia esse tipo de som, há dez anos, desde setembro de 2001, no Bairro Bom Fim, em Porto Alegre, o Bar Ocidente reserva o segundo sábado de cada mês para a concorrida festa Balonê. Uma reunião do que há de melhor no gênero. Com a participação de vários DJs tocando os maiores hits e uma produção para nenhum saudosista botar defeito, o clima anos 80 impera no ambiente. Por conta do seu sucesso, o evento já precisou de edições extras, uma deles ocorreu no DC Navegantes, na Zona Norte da Capital, reunindo mais de quatro mil pessoas, segundo os seus organizadores.
Para apimentar o reencontro com os 80, costumam ser chamadas figuras emblemáticas que se notabilizaram na década perdida – maneira pela qual ficou conhecida no Brasil e na America Latina. Sidney Magal, Biafra e Gretchen já fizeram show na Balonê. “Essa década fervilhou em todos os sentidos, na musica e na estética visual. Nenhuma outra teve tanta importância como ela. Muitas correntes musicais foram formadas naquele período”, resume com entusiasmo Thaís Sherer, 36 anos, DJ e uma das produtoras da festa Balonê .
No cinema ocorre uma enxurrada de filmes baseados em sucessos que se referem aos eighties. São refilmagens e novas versões que acabam alimentando discussões acerca de temas como criatividade, jogada de marketing e falta de espírito criativo. As cabeças pensantes que atuam na indústria cinematográfica mais poderosa do mundo, a norte-americana, sabem que boas idéias do passado somadas às tecnologias digitais de hoje resultam em bons lucros. Nessa esteira, pipocam nas salas de exibição da capital gaúcha o filme “A Hora do Espanto” cujo original se tornou um ícone dos anos de 1980.  Ainda este ano está para estrear o remake de “Footloose”.  O filme dançante que catapultou Patrick Swayze para a fama, “Dirty Dancing” (1987), já foi anunciado pelo Estúdio Lionsgate que ganhará uma versão atualizada que deve ser lançada em 2012.


Fabrício de Carvalho, radialista, 38 anos, se auto-intitula um nostálgico de carteirinha. Porém, vê com certa ressalva essa onda oitentista gigantesca que vem se configurando de uns tempos para cá. “Acho que essa tendência tem prazo de validade para acabar, tem festa, tem filmes. Tudo é anos 80. Vai chegar uma hora que as pessoas dirão: chega!”, prevê Carvalho.





Por Walter Ferrera

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