Todo filme hollywodiano com animais que se preze tem que despertar na plateia, principalmente a infantil, empatia através de altas doses de "fofura". Há produções nas quais eles falam, às vezes fazem cambalhotas, em outras interagem com pessoas como se fossem uma delas. E nesses tempos de “trate bem os animais”, algo que toma força avassaladora através do Facebook e afins, nada mais conveniente às vésperas de Natal do que as salas de exibição receberem um exemplar.
Porém, mesmo apesar do pôster e o título que ganhou no Brasil, o novo filme do diretor Cameron Crowe, “Compramos um Zoológico” (2011), não foi realizado exatamente com esta intenção. Ou se foi, ficou na cabeça dos produtores caça-níqueis. Com data de estreia para o próximo dia 23/12, a película, encabeçada pelo astro Matt Damon, supera as expectativas. Os bichinhos estão todos lá, porém, apenas cumprem o seu papel como coadjuvantes em um drama humano sensível e cativante baseado em fatos reais.
Tudo começou em 2006 quando o jornalista inglês Benjamin Mee, colunista do “The Guardian”, que após perder a esposa em decorrência de um câncer, resolveu adquirir um parque zoológico na região de Devon, no Reino Unido. A finalidade era ter uma nova ocupação e mudar de ares na companhia de seus dois filhos, um adolescente e uma menina de sete anos, ambos fragilizados pela perda da mãe.
A incrível jornada de Mee acabou se transformando num livro autobiográfico, depois virou uma minissérie da BBC e do National Geografic. Anos depois, a Fox comprou os direitos para transformá-lo em um longa-metragem sob a direção de Crowe, responsável por pequenas jóias como “Singles - Vida de Solteiro“, (1992) e "Jerry Maguire" (1996).
O roteiro, escrito a quatro mãos em parceria com Aline Brosh McKenna, de “O Diabo Veste Prada”, recebeu os tratamentos necessários para que a “realidade” mostrada no filme ficasse mais próxima do público norte-americano. Em vez da Inglaterra, vê-se o sul da Califórnia, onde mini zôos são comuns. No entanto, a essência se manteve, e o que se vê na tela, muito em virtude da habilidade de Crowe, são animais usados como plano de fundo para que a plateia se sensibilize com temas bem humanos como perda, superação e conflitos entre pai e filho. O realizador tenta fugir dos clichês habituais do gênero e para isso usa de elogiável sutileza através de recursos narrativos, como a aparição da esposa já falecida. O que não chega a surpreender, mas possui eficácia consistente na trama sem precisar apelar para o pieguismo. A performance do protagonista contribui significativamente para isso.
Matt Damon surpreende a cada novo projeto. Depois de dar vida ao já lendário Jason Bourne, personagem bem ao estilo exército-de-um-homem-só, coisa que conferiu ao gênero de ação ritmo, inteligência e, pasmem!, um senso de humanidade. Bourne é um herói de carne e osso nunca visto antes no cinema norte-americano, com suas nuances e complexidades em torno da busca por sua origem. Só mesmo o “Gênio Indomável”, Matt Damon.
Mais recentemente, tendo Clint Eastwood como guia, pela segunda vez, a primeira deu-se em “Invictus” (2009). O ator convenceu muito bem aos espectadores e a crítica com seu vidente em crise existencial no drama paranormal "Além da Vida" (2010).
Em “Compramos um Zoológico”, ele esbanja competência em forma de carisma e, mais uma vez, talento dramático no limite do correto. A discussão entre o seu personagem e o de seu filho adolescente é um dos pontos mais bem fundamentados no gênero em que a película se enquadra, o drama. Apesar de estar sendo anunciada como comédia, vá lá então, temos mais uma “dramédia”.
Scarlett Johansson escalada para viver o seu par “quase” romântico, apesar de bela e sensual, não convence como funcionária voluntariosa que se apaixona pelo viúvo boa praça. Mesmo com pouca maquiagem e indumentária de operária padrão, não há como deixar passar despercebido toda a sua sensualidade. Em alguns momentos tem-se a impressão de que ela vai agarrar de forma animalesca, no sentido sexual mesmo, o papai vivido por Damon.
Uma estrela com verve dramática e físico mais adequado para este tipo de personagem teria acrescentando mais ao enredo. Hillary Swank, e até mesmo Emily Blunt, recentemente vista ao lado do ator em “Agentes do Destino” (2011), soariam mais verossímeis. Talvez a escolha mais acertada seria Amy Adams, que inicialmente foi cotada para o papel.
A química entre a recente musa de Woody Allen e o eterno Bourne não engatilha, propositalmente em consequência do cuidadoso olhar de Crowe em imprimir maior ênfase ao drama principal de Benjamin, a superação da perda do amor da sua vida, do que propriamente a um romance forçado. Opção saída da cabeça dos produtores. A prova é que Scarlett Johansson foi escolhida por eles enquanto Matt Damon recebeu um convite especial do diretor.
Aliás, não apenas em relação a seu protagonista, mas também quanto a trilha sonora, percebe-se o dedo, ou melhor, a mão inteira do cineasta. Cameron Crowe por muito tempo trabalhou como editor de cultura especialista em música na revista “Rolling Stones”, com a qual ainda contribui com seus textos. Foi enviando um CD que continha 17 canções que falavam muito do ex-jornalista do “The Guardian”, e agora dono de zoológico, que ele conseguiu convencer o maior amigo de Ben Afleck a entrar no projeto. As músicas "descreviam o personagem muito melhor que qualquer coisa que eu pudesse dizer”, declarou Crowe numa entrevista concedida à jornalista Ana Maria Bahiana, publicada no site Uol na última terça-feira.
No elenco ainda se destacam a irmã caçula de Dakota Fanning, Ellen, no papel de uma adolescente apaixonada e apaixonante, além de Thomas Haden Church, como o irmão mais velho e bem humorado de Mee, e Colin Ford, que interpreta o filho “aborrescente”... Ah! Os momentos “fofura” aparecerem na produção sob a pele, não de um coelho ou algo que o valha, mas sim de Maggie, Elizabeth Jones, atriz mirim que vive a filha caçula de Benjamin Mee.
Por Walter Ferrera
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